domingo, 1 de julho de 2012

O conto do Pesca Nada

Tomo em punho aqui a escrever um conto, um conto diferente sobre um homem pacato, que vivia a pescar sem isca todos os finais de semana em um dique defronte a um mar calmo.
Todo o domingo de manhã quem visitasse o tal dique em uma cidadezinha pequena não se sabe lá onde, ei de encontrar um tal homem que a todos era conhecido como o Pesca Nada. Muitos pescadores visitavam o local apenas para zombar do pobre homem que todos os finais de semana estava ali de prontidão sentado no dique tomando água em garrafa e com sua caixa de peca do lado. Ao que todos dizem, ali naquela região não há peixes por causa de uma hidrelétrica construída na cidade vizinha, os peixes que ali habitavam buscaram condições de vida mais prospera para fertilização na praia seguinte aquela.
Toda vez que os pescadores iam a praia ao lado, paravam exatamente naquele ponto para ir ver como andam as coisas com o pobre Pesca Nada. Um dia, um dos homens perguntou ao pescador pacato se ele usava algum tipo de isca, o pescador lhe respondeu que não, pois sabia que o peixe viria assim mesmo; O pescador que havia lhe perguntado disse que era tolice e que até mesmo os índios pescavam com algum tipo de artificio para atrair os peixes.
 Outro dia no entanto, o mesmo homem parou para ver se havia alguma novidade em relação ao Pesca Nada, perguntou-lhe se ele sabia que ali não havia nenhum peixe. O pobre pescador olhando com olhos sinceros para o homem respondeu-lhe que se havia peixes ali, há de ter de novo. Mais uma vez o homem o chamou de tolo e disse que não há paciência suficiente em um ser humano para esperar o que não existe.
 Num domingo chuvoso, os pescadores voltavam já de suas pecas em picapes com caixas lotadas de peixes, gritaram lá de longe ao avistar o Pesca Nada sentado no dique. 
-Então Pesca Nada? Olhe só para nós, o mar esta agitado hoje, talvez você tenha sorte... Isso é, se sobrar algum. E riram-se todos.
 Em um final de semana no verão, um dos pescadores decidiu levar o filho mais velho, que havia acabado de chegar de outra cidade onde morava com sua mãe, para pescar. Contou-lhe as curiosidades a respeito do famoso Pesca Nada, disse-lhe que o homem apareceu ali de repente e que ninguém sabeia onde ele morava, isso faz uns vinte anos. O filho do homem ficou surpreso e fascinado pela historia, afinal o que espera este pobre pescador? -Se perguntava o garoto. Lição de fé é o que não parece ser.
 Então, a caminho da praia o homem decidiu parar bem perto do dique onde ali estava o famigerado Pesca Nada. Mais uma vez lhe veio a pergunta: -E então Pesca Nada? Alguma coisa? -E mais uma vez a resposta bondosa e calma do pescador: -Ainda não. Acanhado com a situação, o garoto não titubeou em perguntar: -Afinal o que espera ai homem, se não um peixe?
 O pescador se surpreendeu, pela primeira vez alguém havia lhe feito a pergunta certa, o pescador com bondade nos olhos fitou o menino e lhe disse:
-Espero sim um peixe, mas não qualquer peixe. Um peixe que estava pré destinado a cair em meu anzol. 
-Mas de onde você criar esta paciência toda?
 O bondoso pescador pediu para que o menino se sentasse, pediu que ele olhasse para aquela água calma, pacifica assim como o pescador. Então disse-lhe que contaria sua historia de vida, e pediu para que o menino não se preocupasse pois seria breve. 
 -Sabe meu jovem rapaz, muitos pescadores vem aqui saber se pesquei algo, enquanto outros de que forma eu pesco, mas ninguém nunca me perguntou por que eu pesco. A pescaria é um hobby muito mal utilizado pelos homens, se pescam peixes grandes eles os encaixotam, antes tiram uma foto e depois levam para jantar. A vinte anos perdi a minha família por causa dessa hidrelétrica, para você que não sabe, fomos retirados a força pelas autoridades e passamos fome durante alguns meses, meu filho mais novo não resistiu e morreu de anorexia, minha mulher faleceu após pegar uma doença muito grave por conta do barbeiro que a havia picado. Moramos em um barraco durante esses meses, vi minha família se dissolver diante de meus olhos. Aprendi ali a ter paciência, pois eu espero a morte vim até a mim assim como foi até eles. O motivo deu estar aqui pescando ou tentando pescar é que os peixes que aqui viviam também perderam suas casas, e aposto que muitos suas famílias. É triste pensar que animais não tem sentimento, principalmente peixes que são considerados acéfalos, porém em um dia de muita tristeza vim aqui para o dique pensando em me suicidar, olhei para a água e vi que ainda havia uma família de peixes aqui, aos poucos observei que todos foram morrendo, menos um. Não uso isca pois a morte não precisa de atrativos para matar. Então deixo aqui o anzol parado, sempre a espera deste peixe.
-E como sabe que ele não morreu? -indagou o menino.
-Porque ele tem o mesmo destino do que o meu.
-E qual é? -perguntou o garoto intrigante. 
-Viver até que nos encontremos, por que assim juntos podemos ir para nossas famílias.
 O garoto deixou cair uma lagrima e disse:
-Mas como isso é trágico.
E o pescador sorrindo lhe falou:
-A tragédia é apenas uma ilusão da nossa mente para o que de fato é a vida. Trágico seria continuar a viver quando o que se tem de mais importante já se foi. Trágico é pescar milhares de peixes sem saber que está impedindo com que eles se proliferem e mantenham o equilibro ecológico.
 O garoto achou um pouco estranho as palavras ditas pelo pescador, achou que talvez o homem estivesse delirando. Um certo dia fez-se fuzuê na cidade. Um pescador que estava voltando de sua pesca disse ter visto o Pesca Nada fisgar algo no anzol. Todos correram para lá. Muitos chegaram a tempo de ver o pobre pescador puxando o peixe para o dique. Era um peixe enorme, lindo, com varias cores, não se podia identificar sua espécie. Todos ficaram encantados, outros assustados. Era incrível ver aquela criatura. Um dos pescadores se aproximou do Pesca Nada e perguntou-lhe:
-Bravo! E agora? O que vais fazer homem? não vai arremata-lo? 
O pescador com a mesma calmaria de sempre respondeu-lhe:
-Não. Por que ei de fazer isso com o pobre coitado?
-Pobre coitado? Pobre coitado é o senhor que esta ai morto de fome, decerto. -Respondeu o outro indignado.
-Sim. Não como há vinte anos.
-Vinte anos! vala-me Deus! Como aguentastes tanto tempo? -Surpreendeu-se o homem.
-Apenas bebi água.
-E as proteínas?
-Era a água deste mar, aqui contem proteínas suficientes. -Disse o pescador sem alterar a expressão.
-Mas oras! Como podes? Não creio nisso.
-Não é questão de crer, é apenas de entender.
-Mas então, nem uma fotinha?
-Fotos? Não, não. Já estou indo, cumpri meu papel aqui, não há motivo para fotos.
 E o Homem jogou o peixe ao mar novamente. Todos gritaram e falaram que de fato ele estava em sandices de tanto tempo que passara ali. Alguns finais de semana se decorreram e os pescadores perceberam que o velho Pesca Nada não estava mais ali no dique como de costume, decidiram procurar a casa do pescador, e para reforço chamaram as autoridades. Na manhã seguinte um policial local avisou a um dos pescadores que encontrou a casa e o corpo do velho Pesca Nada. Foi uma noticia de primeira pagina em todos os jornais da região. O homem morava em um barraco na beira de uma estrada. Não se entendia qual o proposito do homem, afinal, se não era uma demonstração de fé, o que era?
 Não se sabia ao certo, mas fizeram uma estatua em homenagem ao Pesca Nada sentada no dique. Anos depois o menino foi vistar o local, que agora era ponto turístico. Avistou ao longe uma família de mendigos sentados no dique, o jovem parou o carro e vendo que estavam também pescando, lhes perguntou.
-Estão querendo fazer o mesmo que o Pesca Nada?
E o pai da família lhe respondeu:
-Não, não meu filho. Pesca Nada apenas nos mostrou o caminho para se chegar ao céu sem desespero. Estamos apenas esperando a nossa hora chegar, assim como os peixes esperam a deles pegando o nosso anzol. Pois os peixes são sabeis e quando um anzol não possui isca, eles o fisgam, porquê este esta se entregando por livre e espontânea vontade, assim como nós.

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